“Respondeu-lhe Natanael: Pode, por ventura, vir coisa boa de Nazaré? Filipe retrucou: Vem e vê.” - João 1:46
Ao refletir sobre algumas passagens da Bíblia, tenho a convicção de que embora o homem tenha “evoluído” tanto em dois mil anos no que diz respeito à ciência, tecnologia, medicina, engenharia e etc, ele continua com os mesmos conceitos e instintos no que tange a sua conduta social. Apesar da mudança de cenário, quebra de tabus, valorização da mulher na sociedade, é nitidamente visível que o homem, intrinsecamente, continua com o coração enganoso na hora de avaliar seus pares.
Para exemplificar bem isto, posso me usar como referência. Sou o caçula de uma família caucasiana, filho de um metalúrgico com uma dona de casa que cresceu no subúrbio de Belo Horizonte. Cresci, ouvindo e fazendo piadas sobre negros, na época isso não era moralmente condenável. Chamar seu amigo de crioulo, tizil e negão, era comum. Não quero dizer aqui que aprovo estes hábitos, muito pelo contrário, mas como já cantava há 20 anos o rapper Gabriel o Pensador “E de pai pra filho o racismo passa em forma de piadas que teriam bem mais graça se não fosse o retrato da nossa ignorância, transmitindo a discriminação desde a infância”, mostra que nossa sociedade evoluiu em não mais tolerar ou aceitar este tipo de conduta. Lógicamente isso não veio naturalmente e foi necessária a criação de leis para garantir que o racismo não continuasse a ser disseminado de forma tão aberta. Graças a Deus por isso!
Hoje, nossa sociedade não tolera mais este tipo de racismo explícito, porém continua fazendo de forma velada, e o que é pior, de modo cômico, onde a sociedade aprova, reproduz e reforça a maneira engraçada de discriminar. Astutamente velamos o preconceito racial o modificamos, com um produto transgênico, para o preconceito social. Melhor achincalhar o pobre, quem em grande parte, por desigualdade racial em um passado não tão distante, é composta de negros ou pardos. Não vamos falar da cor, mas vamos falar da situação financeira, não falaremos do cabelo crespo, mas mostraremos que mulher bonita é aquela com escova progressiva, vamos falar de seu bairro, suas roupas, da sua linha de ônibus, de suas músicas e tudo que está presente no universo das classes mais pobres deste país. Vamos criticar qualquer ação governamental que consiste em tratar essas pessoas como um ser humano de verdade. Afinal, sendo negros ou brancos, para a grande maioria são pobres e como cantara Caetano Veloso na música Haiti, “pobres são como podres”.
O Versículo acima mostra o preconceito de Natanael com relação ao Lugar de onde Jesus veio. Pode por ventura, Vir coisa boa de Nazaré? Contextualizando nos dias de hoje, poderia por ventura vir coisa boa de Nova Contagem, da Pedreira Prado Lopes, do Capão Redondo ou do Morro do Alemão? Não darei a resposta, examinem-se a si mesmos e meçam o grau de preconceito social dentro de cada um e assim como eu, busquem a cada dia, matá-lo dentro de vocês, vigiando, medindo e observando o a sutileza de ação, a forma debochada e engraçada e até charmosa em segregar socialmente. Somos o Natanael, os senhores de engenho do século XXI, morando na cobertura de blindex da zona sul ou no barraco de palafita da periferia, assim somos, nem sempre porque queremos, mas porque nos ensinaram que assim era pra ser, e se a gente quiser, com a Graça de Deus, não mais assim será.